Este buscador espiritual foi um arquiteto pioneiro da ponte Leste-Oeste

por Barbara Platek e Steve Soiffer

É 1985. Dez mil milhas ao redor do globo, um visitante entra em um pátio modesto que serve como um ponto de encontro para um dos mais respeitados líderes espirituais da Índia, o Shankaracarya de Kanchipuram. Passando pela comitiva de atendentes e seguidores, o visitante cumprimenta reverentemente o iogue de noventa e um anos e, silenciosamente, entrega a ele uma fotografia. O Shankara olha para a foto desbotada e um sorriso lento passa pelo seu rosto gentil. A fotografia é de Paul Brunton.

O Oeste foi para o Leste. Centros zen e restaurantes vegetarianos estão por toda parte; os suburbanos estão meditando; yoga, karma e guru são palavras familiares. Traça as origens desta virada para o leste, no entanto, nomes como Watts e Suzuki vêm à mente – não Paul Brunton (1898-1981), o autor, filósofo e arquiteto pioneiro da ponte Leste-Oeste.

Desde o início dos anos 1930, os livros de Brunton sobre o pensamento oriental e a cultura ocidental venderam quase dois milhões de cópias. Seu primeiro livro, A Índia Secreta, é reconhecida como uma introdução à filosofia yoga para os ocidentais. O Teosofista Americano saudou Brunton como “um dos pensadores mais perceptivos do Ocidente e um dos mais profundos estudiosos da Sabedoria Antiga”. Ainda assim, ele permanece estranhamente desconhecido para toda uma geração de buscadores espirituais ocidentais.

Ou talvez não tão estranhamente. Em 1959 – com a publicação de seu último livro e no auge de uma carreira repleta de ofertas para fundar ashrams e publicar periódicos – Brunton desapareceu. Uma vez, um jornalista determinado a viajar por terras estranhas para relatar sobre a espiritualidade oriental optou por abandonar seu papel mundano para atravessar aquelas regiões do coração, onde todas as tradições se tornam uma só.

O que ele descobriu durante essa jornada de duas décadas em seu próprio ser? Ninguém pode dizer com certeza. Podemos apenas imaginar a magnitude das mudanças pelas quais ele passou, pelas evidências do legado que ele deixou: seus cadernos – cerca de dez mil páginas que Brunton descreveu como sendo uma versão mais “madura” de seu trabalho anterior. Desde 1984, a Larson Publications publicou um conjunto completo, dezesseis volumes de The Notebooks of Paul Brunton, incluindo:

Perspectivas; A Busca; Práticas para a Busca, Relaxamento e Retiro; Meditação e o Corpo; Emoções e Ética e o Intelecto; O Ego e Do Nascimento ao Renascimento; Cura do Ser e Os Negativos; Reflexões sobre Minha Vida e Escritos; A Experiência Humana e As Artes na Cultura; Os Sensitivos; O Oriente; O Impulso Religioso e a Vida Reverencial; Relatividade, Filosofia e Mente; Inspiração e o Eu Superior; Contemplação Avançada e A Paz dentro de Você; e Mente Iluminada, Mente Divina.

(NOTA: Os primeiros três volumes foram publicados em português pela Editora Pensamento).

Ler o “novo” Brunton é redescobrir um velho amigo. Sábio e compassivo, ele oferece um conselho sincero sobre as armadilhas e possibilidades da prática espiritual. E assim como o mundo mudou enormemente nos últimos vinte anos de sua vida, Brunton também evoluiu e adaptou sua abordagem para melhor atender às necessidades dos buscadores de hoje. Embora ele ainda estivesse olhando para o Oriente em busca de inspiração e orientação, ele não acreditava que os ocidentais precisassem raspar suas cabeças ou sentar de pernas cruzadas em uma floresta para alcançar a realização espiritual. Em vez disso, ele ofereceu um guia simples e direto de como as introspecções filosóficas do Oriente e do Ocidente podem ajudar a criar beleza, alegria e significado em nossas vidas – como as vivemos, não como poderiam ter sido vividas se tivéssemos nascido em outra época.

Brunton começou sua carreira silenciosamente como um jornalista de Londres nas primeiras décadas do século passado. Embora ele fosse um repórter inquisitivo e talentoso, seu interesse não estava na política nem nos eventos atuais, mas nos antigos enigmas que desafiaram filósofos através dos tempos: Qual é o significado do mundo e da experiência? O que eu sou? Qual é o objetivo da existência? Ao contrário de muitos de seus contemporâneos da era do jazz, Brunton reconheceu essas questões como mais do que apenas abstrações para refletir a respeito, mais do que sobre conhaque e charutos. Para ele, eram questões vitais. Desde sua juventude, elas atraíram sua atenção.

Outros jornalistas de sua época escreveram sobre debates no Parlamento ou sobre os sucessos e fracassos do colonialismo britânico, então no seu auge. Brunton investigou as regiões desconhecidas da alma. Para sua tarefa, ele trouxe uma gama completa de habilidades jornalísticas, buscando deliberadamente aqueles indivíduos – filósofos, cientistas, místicos – que poderiam ter as respostas que ele desejasse. Não era incomum encontrá-lo sinceramente folheando uma cópia de Emerson ou se introduzindo suavemente em uma reunião da Sociedade Teosófica de Londres.

Mas a busca de Brunton não se restringia às questões conceituais. Uma força interior o agarrou, levando-o, de forma irresistível, a sondar além da superfície da vida. Com sua meticulosidade característica, ele começou a rastrear cada indicação disponível para ele. Ele ponderou sobre todos os tipos de textos recônditos – no Platonismo, no Taoísmo, no Vedanta – e investigou tendências modernas como a parapsicologia, ocultismo e pensamento positivo.

Muitos trabalhos de referência disponíveis hoje, logicamente, ainda não foram traduzidos. As pessoas que cresceram durante os últimos vinte anos podem ter dificuldade em perceber o quão esotéricos esses estudos foram  uma vez. Mas, a pesquisa de Brunton foi excepcional; uma pessoa que o conheceu durante seus últimos anos observou que o livro de endereços de Brunton continha os nomes de praticamente todos os indivíduos e organizações, mesmo que remotamente ligados a coisas espirituais.

De fato, Brunton conheceu muitas pessoas – autoridades reconhecidas, como D. T. Suzuki, C. G. Jung e Annie Besant – mas ele se recusou firmemente a dar lealdade exclusiva a qualquer um dos caminhos que ele explorou. Conduziu sua pesquisa tanto com uma mente profundamente analítica, quanto abertamente receptiva. Se ele não estava disposto a desistir de sua privacidade e independência, juntando-se a grupos ou cultos, ele todavia estava preparado para reconhecer impulso espiritual genuíno onde quer que encontrasse: em outros indivíduos, na beleza da natureza e nas profundidades silenciosas de suas próprias meditações.

Como ele prosseguiu com seu trabalho durante o final dos anos vinte e início dos anos trinta, uma única imagem surgiu uma e outra vez na mente de Brunton. A Índia, então considerada por muitos como uma terra de encantadores de serpentes, de olhos sonolentos e andarilhos vestidos de amarelo, captou seus pensamentos. Há muito tempo ele reverenciara a rica herança filosófica da Índia e foi às margens do Ganges que ele esperava descobrir uma tradição espiritual viva.

Chegar ao Ganges ou a qualquer outra parte da Índia, não era uma tarefa simples naqueles dias. Não era só pegar um voo e reservar um quarto com antecedência no Hilton Calcutta. Viajar para a Índia exigia muito tempo e mais dinheiro do que um jornalista freelance poderia facilmente juntar. Por muitos anos, o sonho de Brunton permaneceu não realizado.

Foi uma conversa casual com um brâmane erudito que convenceu Brunton de que, apesar dos obstáculos, ele não podia mais resistir ao chamado do Oriente. Com o caderno na mão, partiu avidamente para sua tão esperada Índia, dando continuidade à busca.

Que visão estranha ele deve ter tido, um londrino elegantemente vestido agachado na areia ao lado de iogues vestidos de tangas, desatento ao desprezo de seus compatriotas britânicos. Mas era a natureza de Brunton penetrar nas aparências e não defendê-las. Ele perseverou em sua jornada – muitas vezes de burro ou carroça de boi – com seu espírito pioneiro característico.

E ele foi recompensado por sua persistência. Viajando pelas estradas secundárias do subcontinente indiano, ele testemunhou performances estranhas – iogues enterrados vivos sem dano aparente, mágicos restaurando a vida de animais mortos, fakirs perfurando suas peles com espetos, sem sinais de dor ou sangue. Brunton ficou impressionado com esses feitos sobre-humanos e com a extraordinária disciplina mental e física que sugeriam. No entanto, ele sabia que deveria haver mais, que por trás dessas brincadeiras circenses havia outra Índia, mais estranha e silenciosa.

Ele, às vezes, sentia que vislumbrava essa outra Índia – na devoção até mesmo dos praticantes mais extravagantes, por exemplo. Ele ainda não estava satisfeito. Ele havia testemunhado situações exóticas suficientes para preencher as páginas de um bom livro de viagens, mas Brunton começou a suspeitar que sua viagem tinha sido em vão.

A Índia, no entanto, parecia ter seus próprios planos para ele. No momento em que ele estava se preparando para continuar sua jornada, Brunton foi encorajado a consultar mais um homem santo. O conselho veio diretamente do Shankaracarya de Kanchipuram, o líder espiritual do Sul da Índia. O sábio era Ramana Maharishi.

Quão raro deve ser encontrar um sábio – alguém de realização elevada que possa dar um vislumbre de iluminação. Ramana Maharishi era tal pessoa. Nos anos vindouros, Brunton se encontraria com outros guias legítimos; alguns deles o iniciariam nos níveis mais altos do misticismo filosófico. Ainda assim, foi Ramana que sempre ocupou um lugar especial em seu coração. O livro de Brunton, A Índia Secreta, logo traria a atenção do mundo para esse simples homem sábio. Porém, quando Brunton viajou pela primeira vez até a montanha Arunachala para encontrá-lo, Ramana Maharishi era conhecido somente por poucos de seus seguidores.

Ao chegar ao simples ashram na montanha, Brunton encontrou Ramana absorto em profunda meditação. Isso em si não era surpreendente – muitos adeptos que ele havia se aproximado pareciam ser igualmente absorvidos. Mas, quando Brunton ocupou seu lugar no longo e silencioso corredor, se conscientizou de algo único: o Maharishi irradiava uma paz rara e palpável, mesmo quando se sentava imóvel.

Enquanto Brunton se aquecia naquele silêncio, sentiu sua angústia, suas perguntas não respondidas e  as tensões de sua busca se dissipando. Por fim, ele tinha certeza das possibilidades mais elevadas abertas à humanidade.

Brunton escreveria em anos posteriores,  “A natureza divina revela-se a cadamomento em toda vida humana. As pessoas fazem uma investigação formal e pretensiosa sobre o mistério e o significado da vida, quando o tempo todo, cada pássaro empoleirado em seu galho verde, cada criança segurando a mão de sua amada mãe, resolve o enigma e carrega a resposta em seu rosto”.

Brunton passou muitas horas com o Maharishi e ganhou grande percepção da realidade subjacente a cada indivíduo e toda a natureza. Ele afirmou que essa realidade pode ser diretamente experimentada e que a comunhão com ela é o direito de nascença de cada pessoa.

Pouco se sabe sobre o restante dos dias de Brunton com o Maharishi. Claramente, contudo, quando chegou a hora dele deixar Ramana, quando finalmente chegou o momento de colocar as palmas das mãos juntas no habitual gesto de despedida, ele o fez com sentimentos de profunda gratidão e sincera tristeza. Era tentador permanecer com o homem que, nas palavras de Brunton, “o devolvia à sua alma”. De fato, ele visitaria Ramana novamente anos mais tarde. Mas, por agora, Brunton podia sentir que sua busca o chamava. Enquanto sua carroça de boi descia lentamente da montanha, ele sabia que um dia voltaria para o Sábio de Arunachala.

Com a lembrança fresca de Maharishi em sua mente, Brunton retornou a Londres no final da década de 1930. Qualquer um que tenha saído de umas férias tranquilas para a dura e frenética comoção de uma cidade pode, sem dúvida, imaginar quão chocante deve ter sido passar de um ashram asiático isolado para o turbulento centro metropolitano do império britânico. Brunton, no entanto, manteve a paz que encontrara. Ele aperfeiçoou o método de silêncio interior, que lhe permitia permanecer interiormente calmo, até mesmo quando transitava por uma cidade envolvida em ansiosos preparativos para uma segunda guerra mundial. No entanto, seu desapego não obscureceu sua compaixão. Enquanto olhava para os rostos tensos de seus companheiros londrinos, sentia um desejo profundo de compartilhar sua serenidade.

Colocando-se rapidamente para trabalhar, ele escreveu cinco livros em três anos – livros que ele esperava que fossem um veículo de iluminação para outros, bem como uma base para um novo entendimento entre Oriente e Ocidente. Com base nas descobertas de Sir James Jeans, Sir Arthur Eddington e outros cientistas eminentes da época, ele habilmente procurou trazer a intransigente mente da Ciência Ocidental para um novo alinhamento com os princípios do misticismo e da Psicologia Oriental. Através de seus escritos, milhares de leitores ocidentais aprenderam pela primeira vez sobre meditação, carma e os aspectos espirituais da yoga.

Porém, Brunton fez mais do que simplesmente traduzir ensinamentos estrangeiros para o Inglês. Ele trabalhou para resgatá-los da obscuridade do tempo e da distância cultural e torná-los significativos – vivendo racionalmente compreensíveis – para o moderno interesse ocidental em seus livros, espalhando-se rapidamente entre eruditos e não-acadêmicos. Monk Gibbon recomendou A Busca do Eu Superior como “de longe a exposição mais segura e racional da metafísica oriental e da prática da disciplina mental que eu já conheci”. O London Times elogiou Brunton por apresentar suas ideias com “a menor ambiguidade possível em linguagem não técnica”. Ele rapidamente ganhou uma sólida reputação como expoente experiente e influente do pensamento do Oriente-Ocidente.

Brunton, no entanto, estava procurando pela Verdade, não pela fama. Mesmo quando seus livros estavam sendo impressos, ele ainda buscava por zeladores vivos da sabedoria atemporal – voltando-se agora para o Egito, para a América do Norte e América do Sul e dirigindo-se,  novamente, por duas vezes para a Ásia. Ao sentar-se com adeptos e professores de todo o mundo, aprofundou sua visão de uma síntese do pensamento filosófico oriental e ocidental. Sua vida agora havia se tornado uma busca focalizada pela compreensão mais ampla possível do potencial espiritual humano.

Com cada um de seus onze livros, Brunton incorporou os resultados de suas investigações a um sistema filosófico cada vez mais abrangente. Com o tempo, a forma de escrever mudou visivelmente. Ele já havia relatado muitas aventuras – sua noite na Grande Pirâmide, seu passeio arrepiante pelo trânsito de Cairo com um sensitivo vendado atrás do volante. Em livros posteriores – O Ensino Oculto Além da Yoga e A Sabedoria do Eu Superior – ele apresentou uma sofisticada discussão dos princípios subjacentes aos indivíduos e o mundo. Todavia, tópicos consistentes ainda corriam pelo seu trabalho. Acima de tudo, entre esses, havia uma sincera e infalível reverência pelo sagrado e uma fé inabalável em sua benevolência para com todos os seres.

“Indivíduos”, escreveu Brunton, “podem vir a conhecer uma presença sagrada, tanto dentro quanto fora. Cada pessoa carrega um raio de sua presença dentro do coração”. Ele chamou esse raio de “Eu Superior”. Quanto mais se aproxima do Eu Superior, mais plena e diretamente ele concede sua bênção e orientação. Assim, indivíduos podem começar a ver uma sabedoria divina se desdobrando no universo e em suas próprias vidas, de uma maneira significativa e ordenada. Brunton acreditava que as pessoas estão conectadas a todas as coisas através da lei do carma, mas sua visão dessa lei não é fatalista. Ele viu toda a experiência trabalhando para aproximar cada pessoa da autoconsciência e do reconhecimento do verdadeiro lugar do indivíduo no cosmos. Para Brunton, o cosmos era “soberbamente inteligente para além da invenção humana, misterioso além da compreensão humana e … divinamente santo”. Cada instante, cada ponto da criação, a partir das estrelas acima para cada célula do corpo, pode ser conhecido como o desdobramento de uma mente de inteligência infinita e poder eterno. E tão deslumbrante quanto a criação pode ser, apenas sugere a grandeza daquilo que está além dela. Nas palavras de Brunton: “Existe apenas Um Deus, Uma Vida, Um Poder Infinito, uma Mente onisciente. Cada pessoa individualiza isso, mas não multiplica isso. Ela leva isso a um ponto, o Eu Superior, mas não altera sua unidade ou muda seu caráter”. 

O mundo suportou a Depressão e a segunda grande guerra. Muitas pessoas desiludidas encontraram esperança, consolo e significado nos escritos de Brunton, e muitos procuraram sua orientação pessoal. Porém, como ele apenas se recusou a ter seu nome associado a qualquer religião ou movimento em particular, assim Brunton rejeitou as tentativas de transformá-lo em um guru filosófico. Ele falava de si mesmo como “escritor e pesquisador, com alguma experiência nessas questões, e isso é tudo”. Não obstante, ele sempre estava disposto, de maneira discreta, a compartilhar sua compreensão com outros buscadores próximos a ele, para tornar o seus caminhos mais fácil se ele pudesse. Aqueles que se encontraram ou se corresponderam com ele ao longo dos anos, vieram a amar e admirar muito o homem gentil e gracioso que eles conheciam simplesmente como PB.

Em meados do século, um número crescente de indivíduos e sociedades começaram a se interessar por Brunton. Apesar de suas preferências, ele continuou a receber propostas para se tornar uma figura espiritual para os demais. Ele foi, repetidamente, convidado para estabelecer ashrams, editar revistas e fundar escolas com base em seus livros. Contudo, ele nunca atendeu a nenhuma dessas ofertas.

Em 1959, alguns anos após a publicação de seu último livro, A Crise Espiritual do Homem, e no auge de uma carreira em crescimento, Brunton desapareceu da vista do público. Tão eficaz foi a sua retirada que os obituários apareceram nos principais jornais. Mas Brunton não estava morto. Ele havia apenas abandonado sua profissão mundana em troca de um tipo de trabalho mais silencioso e privado.

Este trabalho – muito do qual ele realizou dentro de seu próprio coração – se fez necessário para que ele se retirasse em completa solidão.

Em meados da década de 1960, Brunton surgiu na Suíça, onde ele viveria pelo resto de sua vida. Os amigos e estudantes que o visitaram durante este período estavam cientes de que ele havia passado por uma mudança profunda. Embora ainda vissem diante deles o gentil cavalheiro britânico com o sorriso travesso, sabiam que também estavam na presença de algo mais raro.

E, de fato, autoridades respeitadas, como T.M.P. Mahadevan (então chefe da Universidade de Madras) e o Shankaracarya de Kanchipuram, começaram a se referir a Brunton como um genuíno homem santo.

Brunton rejeitou tais referências. Levava uma vida simples, viajando aqui e ali, concedendo entrevistas particulares e escrevendo – sempre escrevendo. Ele escrevia diariamente: percepções, observações e sugestões sobre questões relativas ao caminho espiritual e à auto realização. Depois da morte de Brunton, em 27 de julho de 1981, seus cadernos foram disponibilizados para publicação, como ele havia designado, ou seja, seletivamente publicado e, após sua morte.

O ponto culminante de sua busca vitalícia por sabedoria, os Notebooks de Paul Brunton, são um resumo eloquente final de sua experiência. Eles também são um recurso incomparável para outros que estão buscando compreensão. Página após página, volume após volume, ele reúne verdades milenares e senso comum contemporâneo, expondo uma abordagem ética, sensata e convincente à prática espiritual. Sua tônica é o equilíbrio e sua mensagem edificante abrange todas as fases da experiência humana.

As anotações posteriores de Brunton tomam a forma de breves e sucintas passagens, como ele as chamava, “pensamentos semente”. Desejando trazer ideias profundas em foco, ele formulou passagens que levariam seus leitores a um estado de pensamento introspectivo e contemplação silenciosa. Seus tópicos variam de sutilezas metafísicas a instrução prática, mas são, de fato, um todo harmonioso. Em suma, eles afirmam a divindade dentro de cada indivíduo e mostram um caminho para a auto realização.

O trabalho de Brunton é contemporâneo. Ele sabia que os anos 80, certos de serem uma década de crescente complexidade global, não seriam o momento para se retirar do mundo. Ele também sabia que a humanidade não podia mais prosseguir em seu curso destrutivo, sem valores mais profundos. Assim, enfatizou a necessidade de os indivíduos trabalharem coletivamente para afirmar a santidade da existência humana, ao mesmo tempo que procuram particularmente, e em solidão, a fonte de sua própria individualidade. Desta forma, ele acreditava que esta geração poderia estabelecer a fundação de uma, muito necessária nova civilização mundial.

Brunton não oferece atalhos para alcançar o objetivo, nem uma realização instantânea, nem tampouco poderes ocultos ou um fim miraculoso para os problemas da vida diária. Porém, ele oferece compreensão, esperança, conforto e um convite para a maior aventura de todas: a autodescoberta.

“Aprenda a penetrar dentro de si mesmo, seu eu mais profundo, quase desconhecido”, diz ele. “Vai precisar de paciência para voltar dia após dia; não parando, até que a verdade seja alcançada, a paz é sentida, a bênção desce. Vai precisar de perseverança até que a fonte da força seja encontrada. A partir de então, isso tomará conta: isso é a graça. Mas lembre-se: a cada retorno dos esforços diários, você será novamente confrontado pelo mundo, pela sua dura realidade, ainda que uma beleza gloriosa, seus conflitos gritantes, mas interlúdios benignos. Assim, conheça este mundo em que você tem que viver, suas mentes mesquinhas e almas nobres. Aprenda com ambas. E quando você já viu o suficiente da superfície do mundo, peça pelo seu tremendo segredo. ”(Notebooks 2.3.164)

“O primeiro passo é descobrir que existe uma Presença, um Poder, uma Vida, uma Mente, Ser, único, não feito ou gerado, sem forma, invisível e inaudível, em todos os lugares e sempre o mesmo. O segundo passo é descobrir sua relação com o universo e consigo mesmo”.

“Eu juntei meus materiais tanto do Ocidente quanto do Oriente, da ciência moderna assim como da metafísica antiga, do misticismo cristão e também do ocultismo hindu … Minhas pesquisas foram feitas não apenas entre livros modernos e textos antigos, e homens vivos. Eles também foram feitos no misterioso interior da minha própria consciência.”

“Síntese das ideias orientais e ocidentais, mas também uma nova perspectiva criativa que transcenderá ambas. Uma civilização mundial um dia surgirá por meio da propulsão interior e da compulsão externa.”

“Eu desejo, portanto, colocar diante dos leitores os fundamentos dessa filosofia oculta de forma concisa e em frase simples… colocá-los de posse dos princípios básicos e fornecer-lhes um fio de Ariadne para guiá-los através do labirinto da vida e sua problemas de reflexão e experiência. Não, mesmo que eu não consiga fazer isso, mas suceda em acender dentro deles algo do amor da Verdade, essa busca apaixonada pelo significado de toda a vida, toda a experiência e todo esse mundo maravilhoso, eu teria realizado o suficiente para justificar nossa vinda juntos nestas páginas.”

Reimpressão East West Journal, Outubro de 1986